Baldan, Luiza, 1980-
Exercícios de Observação /Luiza Baldan. – 1. ed. – Setúbal : Urutau, 2025.
128 p. ; 13 x 16,5cm.
ISBN 978-85-7105-335-9

Não são evidentes as relações entre a arte e a escrita. Saindo do campo tradicional da crítica e da história, geralmente lemos mais textos que informam sobre uma obra do que aqueles que seguem contribuindo para abrir ainda mais o que pode estar em jogo. No caso de artistas que escrevem sobre os próprios trabalhos, esses produzem com uma liberdade rara, já que não há fórmula prévia para uma escrita desse tipo. Do teórico ao telúrico, eles conseguem produzir algo que, neste livro de Luiza Baldan, é precioso: fazer com que as palavras sejam parte de um tempo espiralado que atravessa duas décadas e seis países.
Com uma rara capacidade fabuladora, Luiza Baldan é esse tipo de artista que faz da escrita uma eletricidade plástica. Em outras palavras, quando lemos os textos deste volume, cada um dedicado a uma série criada pela fotógrafa, as imagens ganham outra voltagem. A excelência literária, sua liberdade de estilo pra cada situação (autobiográfico, jornalístico, poético, investigativo), a beleza original das imagens construídas, tudo isso expande cada foto e vídeo associados pelos títulos àquelas escritas. Se a maioria de seus trabalhos são dedicados a espaços, arquiteturas, geografias, seus textos mergulham em retratos humanos, desnudando anônimos e nos tornando íntimos do que não vemos.
É como se a escrita de Luiza fosse uma contra-pele de suas imagens, pois ela aguça os sentidos e nos fornece um laço sensorial com o visto. Passamos a ouvir os sons, sentir as texturas e perceber os cheiros em cada fotografia. Em suma, como diz a autora, “de histórias vivemos mais que de imagens”. E são as histórias sobre a História, as fabulações que falam do tempo — de sua perda, mas também de sua busca — que transformam as imagens em recortes de algo sempre maior. Talvez seja esta a singularidade da arte de Luiza: a imagem não basta, e a escrita só existe porque há imagens para serem feitas. Uma simbiose que produz um arquivo incompleto, porém perfeito em sua incompletude.
Se as suas fotos são afirmações autônomas de uma força plástica na história da arte, seus textos são peças impecáveis em sua força escritural. Cada um deles conta uma história em si, sustenta uma narrativa delicada de uma artista em trânsito, sempre aberta ao novo e sempre perplexa com o comum. Em um mundo cujo sentimento de perda é constante, Luiza Baldan escreve para que o tempo não seja apenas aquilo que se esvai, e sim o que, ainda, se pode.

Fred Coelho

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